domingo, 27 de setembro de 2015

Ou serei absurdo

     Ou serei absurdo


Sou a materialização do Ser oculto
Que nas vestes do corpo bafiento
Emerge da pele que cobre o vulto
Por entre os retalhos do sentimento

Que devora o desejo inoculo
Quando exprimido no frio
Do tremido e gélido arrepio
Do que soa a falso, no vernáculo.

A tinta gasta pelo pulsar do braço
Que palavra a palavra lacera do verso
Ao que o poeta define como seu traço.

O que junta letra a letra a digna opção
Do segredo que percorre de mão em mão
Do que escrevi, e nada fiz… o absurdo sou!


poema da obra: Ilhéu revolto

domingo, 20 de setembro de 2015

Mefistófeles

   Mefistófeles


Gato pardo que olhas no escuro
Sorrateiro sobre as pedras do passeio
De relance nos teus olhos, o meu futuro
Animal esguio, do meu anseio.

Por entre o véu que cobre o mundo
Exalo gotas de desespero profundo
Que brotam rudemente da boca
Enquanto consumo a fuga louca

Por entre frascos e cacos de vidro
Películas e papéis. Procuro o proibido
Muito para além de tal trágico vulto
Nada mais resta, senão piedoso indulto

Olhos penetrantes de feitiço como a lua
Pousados sobre o veludo debaixo do telhado
De negro xisto onde o destino está selado
E agora a minha alma é toda tua!


poema da obra: Ilhéu revolto


domingo, 13 de setembro de 2015

A fusão

    A fusão


Hoje escrevo para mim a dor,
Que amanha vou sentir no vazio.
Com o lápis pincelo o terror,
Num poema negro de carvão frio.

Sou a besta, fera na criação
Arranco, rasgo com a definição
Escrevo promíscuo e egoísta
O bélico que o verso conquista.

Da boca cuspo, o ser loucamente
Traçado no cinzento do negrume
Por entre as linhas compostas do verso.

Corpo, mente amam sofregamente
Que o desejo a isto se resume:
- Mortas! As palavras do universo!


poema da obra: Ilhéu revolto


domingo, 6 de setembro de 2015

Atrasadinho

Atrasadinho


Corre! Corre bicho-do-mato,
Vai a casa e veste o fato.
Ouve! Ouve! Toca o sino.
Vai depressa que está fino!

Ligeiro, ligeirinho vai a caminho,
De sapato engraxadinho.
Passo a passo, estrada fora.
Vai! Vai depressa, sem demora

Cuidado, cuidadinho não pises na bosta.
Que o cheiro cheira a esterco.
E entra na entrada da missa posta
Que o padre reza! E o final do terço perco…
                                                         (Ámen)!


poema da obra: Ilhéu revolto